ABANDONO AFETIVO

Não apenas as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça, mas todo o ordenamento jurídico relacionado ao tema fundamenta de forma clara o ato ilícito praticado por quem abandona um filho. Dessa forma, a Convenção sobre os direitos da Criança, a Constituição Federal (1988), o Código Civil (2002) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990) trouxeram a tutela total à criança e ao adolescente, seres humanos em formação.
A proteção à criança ainda encontra-se expressa na Convenção da Organização das Nações Unidas, sobre os Direitos da Criança, que foi ratificada pelo Brasil através do Decreto nº 99.710, dispondo o Art. 7.1, que “A criança será registrada imediatamente após seu nascimento e terá direito, desde o momento em que nasce, a um nome, a uma nacionalidade e, na medida do possível, a conhecer seus pais e ser cuidada por eles”.
Podemos ainda consignar, que abandonar um filho é forma grave de maltrato, ensejando a patente violação ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III, da Constituição Federal de 1968) que preside todas as relações jurídicas e submete todo o ordenamento jurídico brasileiro.

Sobre esse tema, a CF/88, no caput do art.227, dispõe que é dever da família, entre os mais diversos listados, assegurar o direito da criança e do adolescente à “convivência familiar”, bem como, “colocá-los a salvo de toda a forma de negligência e discriminação”.

E, assim, quando a Constituição determina que se deva colocar a criança e o adolescente a “salvo de toda a forma de negligência”, não há dúvida alguma que estão incluídos ali: os atos de desprezo, de humilhação, rejeição, que são praticados pelo autor do abandono afetivo.

Sobre os deveres do Poder Familiar, ou seja, dos pais com seus filhos, a Constituição Federal, em seu art. 229, foi ainda mais incisiva, senão vejamos:

“Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.”

Dessa forma, o artigo 229 da nossa Carta Maior, determina de forma expressa, que é dever dos pais ASSISTIR, CRIAR e EDUCAR os filhos menores, e a redação é tão clara, que impressiona ainda que exista alguém que entenda que a obrigação dos pais é apenas de sustento.

Ainda que o artigo 1º da Constituição Federal seja mais amplo, pois abrange toda e qualquer forma de violação à dignidade da pessoa humana, os artigos 227 e 229 são mais do que específicos ao determinar tal obrigação legal, sepultando qualquer tipo de dúvida sobre os deveres dos pais em relação aos seus filhos menores.
Vale ainda destacar a clareza do novo Código Civil (2002), que também destacou tais fundamentais deveres do poder familiar:
Seção II
Do Exercício do Poder Familiar
Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores:
I – dirigir-lhes a criação e educação;
II – tê-los em sua companhia e guarda;
Como se não bastasse a nossa Carta Maior e o Código Civil, o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhecendo a vulnerabilidade das crianças e dos adolescentes, trouxe uma tutela total e irrestrita, visando uma proteção especial, em diversos artigos e destacaremos o artigo 22 a seguir, senão vejamos:
Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.

Ante o exposto, não pairam dúvidas de que o Poder Familiar está devidamente regulamentado em nossa legislação, em especial nos artigos 227 e 229 da Constituição Federal (1988), no art. 1634 do Código Civil (2002) e no art. 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente (1990).

Sendo assim, toda a legislação em vigor, tem prestado proteção especial e irrestrita às crianças e aos adolescentes. O abandono é ilícito que se reveste da maior gravidade possível, pois atenta contra a dignidade constitucional da família, ao princípio fundamental da Dignidade da Pessoa Humana, e gera efetivos danos aos direitos de personalidade da criança. Sendo ainda certo, que dentre os deveres inerentes ao poder familiar está o de convívio, cuidado, proteção, criação e educação dos filhos.

A ilicitude não está no desamor, mas na mais absoluta falta de atendimento ao dever de cuidado, requisito mínimo a ser empreendido na vida de uma criança para seu pleno desenvolvimento.

A Constituição Federal apontou a Dignidade da Pessoa Humana como princípio fundamental do Estado brasileiro, sendo este harmonizador de todo o sistema jurídico, senão vejamos:

“Havendo conflito entre princípios de igual importância hierárquica, o file da balança, a medida de ponderação, o objetivo a ser alcançado, já está determinado, a priori, em favor do princípio, em absoluto da dignidade humana. Somente os corolários, ou subprincípios em relação ao maior deles, podem ser relativados, ponderados, estimados. A dignidade, assim com a justiça, vem à tona no caso concreto, se feita aquela ponderação”.(1)

O que nos surpreende é restar alguma controvérsia sobre o abandono de filhos ser ou não ato ilícito. Se houve a violação dos mais diversos dispositivos acima transcritos, logicamente algo deve acontecer no mundo jurídico.

Vale frisar, que o que está sendo tutelado pelo direito não é nenhum sentimento, mas deveres referentes ao poder familiar expressamente previstos em lei, tais como, de criação, cuidado e convivência, que são imprescindíveis para a formação e o desenvolvimento sadio da criança e do adolescente.

(BICCA, Charles Christian Alves. ABANDONO AFETIVO. Editora OWL. 2015. www.owleditora.com.br)

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